Pequena História de um Amor Virtual
To: <Marvin>
*>-----
From: <Mariah>
;-)
Com minha eterna e Leal dívida à Beth
(Só o Diabo
sabe como poderei pagar!!!!)
;-)))
“Vem, por favor, que encharco lençóis...
Quem te
ensinou meu rumo, se sequer te conheço?
Cheiro do
cerco da abelha em flor?
Vem; porque
sei exato teu toque!
Quem te disse
a linguagem que careço, se de ti, nunca ouvi palavra?!
Vem do suor
fora de galope, o cheiro teu?
Te
pressinto...
À flor da pele,
te pressinto...
E me arrepia,
o toque, a alma!”
Índice
De um mundo ao outro *>----- 3
Máscaras e malabarismos – Rasgando fantasias... *>----- 4
Sábias decisões *>----- 5
Riachuelo – Distrito de Coxilha do Fogo –
RS, que não consta do mapa-múndi *>----- 6
FIM de madrugada *>----- 7
De um mundo ao outro
Há algum tempo frequentavam o meio virtual. Vinham sendo assíduos. Quinzenalmente, depois toda semana até que diariamente.
Da
linguagem escrita e assim, órfã, iam descobrindo o poder de fogo. Invisíveis
fios urdindo rede sem volta. Letras e letras numa bizarra escultura
cibernética.
Palavras
vasculhadas esgotando madrugada, risos, gestos de afeto e uma vontade
contaminando sem aviso.
A
fala era decodificada. O timing do
que era dito, outro. A qualquer hora, trabalhando sobre um teclado e dentro de bits que viajavam pelo espaço sideral,
era possível voltar atrás, apagar tudo, pensar novamente, redizer. Os
sentimentos saíam afiados como poesia bonita.
– “To send or not to send?” – brincavam, os dois, reescrevendo
Shakespeare.
Ali,
máscaras eram comuns. Um Baile a Fantasia com sentença sumária pra nudez.
Às vezes, ensaiavam o telefone rompendo um limiar que os
deixava, talvez incomodamente, fora de qualquer um dos dois mundos.
Sempre,
com cuidado, iam tecendo um relacionamento no mínimo peculiar, considerando o
fato de que nunca se haviam encontrado.
O
sonho, no entanto, passava ao largo da cautela.
Seja
por excesso de sociabilidade, ou talvez por profunda solidão, o fato é que, não
importando quão ínfimos fossem os dados “reais”, o menor gesto de agrado era
brecha feita para a expectativa, era deixa para a fantasia mostrar a cara de
mulher fácil, vadia e debochada que tinha. E numa proporção injusta, as
sensações corriam descomedidas, displicentes, como se não houvesse o risco de,
a qualquer momento, virem a se perder em seu próprio espaço e desaparecer nas
estrelas.
Às
vezes, medo e mãos frias apareciam num ensaio tosco e inútil de algemar. Como
calcular verdade, esperança, probabilidade?
Ela
já havia encontrado outras pessoas. Algumas sem tato, algumas sem senso de
humor, outras apenas gentis. Cumplicidade de desejo nunca havia traçado rastro.
Taciturno,
abre vento às suas velas. Ela fala e se mostra, só ao sabor, sem se notar, como bando de
primaveras que tanto houvesse tardado...
Ele
vinha de terra de longe. Terra afeita a horizontes... Fazendo bom gosto em ir... ir... Só dando vastidão ao olho. Lá o vento era
Minuano; pássaro, Quero-quero; árvore frondosa, Jequitibá e metro de solo ou
leito de rio conquistado, sangue e pele de bisavós.
Tinha
nome de rei estrangeiro, talvez daí o hábito à pertença... Tinha nome de rei,
mas jeito manso de planície...
Vinha
da terra de longe e se apropriava, posseiro, lhe roubando os nortes.
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Máscaras e malabarismos – Rasgando fantasias...
Um
dia, plagiando o poeta luso, ele tira a máscara que não sabia. Lava as faces,
esfrega as mãos e vê, com o coração partido, que se lhe aderiram.
Ele
de amor dividido, dormindo ao lado e errante. Ela de tão disponível querer.
O
real invade, feio, alienígena e non gratus.
Há que espantar.
Tinha
tanto pecado bom de pecar inda por vir.
Duelam
fúria e sanidade.
Malabarista
arraiano, o amor vai ateando, nos dois, fogo ferrenho de mesmo soprar e arder. Desapropriação
de corpo e alma sem porteira, cerca, cadeado ou cão de guarda feroz que desse
impedição. Revés de gosto cigano que se entrega e sedimenta. Garimpando pó de ouro, fazendo folha,
lingote, virando lavrantes...
Sessões
fechadas, PCs desligados, arrancados os fios, linhas telefônicas banidas e
nada! O link permanece lá poderoso
como escárnio, roubando-lhes, minuto a minuto do dia, qualquer elementar ensaio
de concentração em outra coisa...
Paixão
dadeira que dispensa agrado maior. Molhada e teso andavam pelas ruas atônitos,
cabeça virada para qualquer primeiro que passasse, como se fosse ele, como se
fosse ela.
Se
ensinam tão bem o que gostam, qual o gosto do real? – anda a mão pelo corpo
sabendo ao outro.
Pioneirismo de imigrantes fronteiriços sequestrados ao futuro.
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Sábias decisões
A
cada encontro, põe seu vestido de maior primavera, se encharca de cor, de
brilho e de cio, confere, uma a uma, das flores, o viço, e, a cada flor, corre
para a janela, aflita com o atraso da lua. Deixa a porta aberta. E a voz dele,
de toque puro feita, lhe sobressalta o coração.
Pata de cavalo chucro pulando cerca.
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Riachuelo
(Distrito de Coxilha do Fogo – RS, que não consta no mapa-múndi)
Como
ela era menos experiente, ele monta atrás. Pega garupa na escusa, toma as
rédeas e coloca assim, vestido e melindre de mulher, sob seu governo e dentro
de braço firme.
Pára
na beira do rio. Fôlego escapulindo dos três.
–
Vira para mim... põe tua perna aqui...
por trás, em volta... isso. Tu tá bem?
–
Senão tu vai te molhar, guria – sai,
talvez de um sorriso, a frase.
O olho dele não
largava o dela enquanto falava.
Solta,
das rédeas, as mãos. O abraço estreita tanto quanto o freio e a brida dão
largueza.
Agora
é nele que ela monta.
Medo
de travessia. Medo de rio ligeiro e manso.
Beira
do medo.
Desfaz
o abraço, afasta o corpo e desce as mãos... pescoço... colo... decote de
vestido impróprio para qualquer outra cavalgada.
–
Tu tá queimando – sai a voz rouca já
misturada no beijo de refrescar. Ali.
E
na boca, ela saliva de pura inveja.
Pega
da água do arroio que ensaiava curva desbarrancando de leve, levando flor e
mato, deixando aqui e ali, em qualquer pedra, um musgo e molha o cabelo, a nuca
e desce.
Banhava-a
ele mesmo com suas mãos e a água alagando a roupa e trazendo flor e cheiro de
mato para a pele, desbarrancando de leve medo e mãos frias.
A
mão dele só dizendo para o corpo
dela.
Ele
salta, puxa-a que escorre justa entre ele e o bicho. Água, suor de bicho e de
homem levantando ainda mais o vestido curto e sem modos.
– Vira...
Presa
contra o bicho e ele por trás, dono de todos os comandos, no governo absoluto
da hora. Bridão de bagual e anca de mulher. Ela já quase gozando ser presa. Ele
tirando mais.
Sincronicamente
respondendo às preferências e ao seu tempo de fêmea.
Jorrava,
enfim, do brilho das telas antes frias e brancas do monitor, fogo de lua amarela e imensa...
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FIM de madrugada
Tem
margem do outro lado ainda sendo olhada. Tem rio para descer ou para subir.
Norte, Sul, Sudeste. Horizonte e estrela para ensinar bússola.
Tem mapa às pampas deitando chão.
:-)
Ela
tá exausta e já tá tão tarde. Vira-se para ele e digita:
> E aí, Marvin, continuamos?
FIM
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